Entre o autocuidado e o Burnout estético: até onde vai o culto do bem-estar?

Figura de uma mulher derretendo em sérum de beleza
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No meio de tantas exigências da vida, quem poderia imaginar que o autocuidado se tornaria mais uma obrigação?

Vivemos em um mundo de aparências e que adora se reinventar ao aproveitar os altos e baixos da vida alheia. Nessas idas e vindas, os padrões sociais de beleza que a gente conhecia perderam espaço e já não são mais os mesmos, graças a uma geração autêntica e política que decidiu lutar para ser quem é.

Esse movimento foi tão importante quanto a deixa perfeita para que empresas de cosméticos vissem valor de mercado no autocuidado, ampliando suas linhas para o que vendem como nossa própria aceitação de quem somos.

E eu não estou dizendo que ter bons produtos voltados para diversos tipos de pessoa é um problema. A questão é como utilizaram da nossa dor e luta para construírem seu próprio discurso de venda com base unicamente no que nós gostaríamos de ouvir. E tudo bem, faz parte do marketing. Mas será que estão mesmo entregando tudo isso?

Hoje, a beleza ganhou um novo patapar: o da alta propagação de marcas de cosmético, que repetem a mesma coisa para um público já fragilizado por anos de padronização de uma beleza inalcançável.

Estamos na era do paradoxo do autocuidado, aquele que nasceu para promover descanso e saúde, mas acabou virando mais uma fonte de cobrança e performance de quem somos e de quem queremos ser.

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O padrão de beleza, antes inalcançável, agora se tornou possível, bastando seguir a receita certa:

• 5 skins care por dia + uma máscara de cada tipo 3 vezes na semana;
• pelo menos 3 cronogramas capilares por semana;
• pré-poo e shampoos sem sal, parabenos e cor;
• 3 limpezas de pele por mês com máscaras variadas;
• hidratante corporal todos os dias;
• base com filtro solar é de uso diário;
• 1 gominha para cabelo e pele toda noite;
• dieta todos os dias + detox semanais, conforme necessidade de desinchar.

No meio de tanta coisa, beber pelo menos 2l de água por dia não parece tão importante assim. Deixar a terapia em dia também não.

Sair para caminhar e ver o por-do-sol muito menos.

Fazer uma atividade física já leva tempo demais.

Ler um livro? Sem tempo. Assistir uma série completa sem reclamar de tantos episódios é impossível.

Dormir pelo menos 7h por dia é uma meta sem sentido. Sentir o sol, respirar ar puro e viajar sem rumo é desperdício.

Há uma grande inversão de papéis no que passamos a acreditar como "autocuidado". E não, não estou questionando você que ama um produtinho de beleza - quem não ama?

A questão é a transição do “me cuidar porque mereço” para o “me cuidar porque preciso estar bem, produtiva e bonita”. Será que voltamos àquela época em que invejávamos as modelos de capa de revista? Os padrões que tanto lutamos para mudar?

Os ritos de beleza agora batem à nossa porta todos os dias: seja pelas redes sociais, pela TV, pelos anúcios insistentes e até mesmo por nossos amigos. O que antes estava apenas no telão do metrô ou nas revistas mais famosas, hoje está bem na nossa cara.

Frases como “autocuidado não é estética, é sobrevivência” estão cada vez mais sendo apropriadas por marcas e influenciadores. Eu me pergunto como foi redefinir o significado de "sobrevivência" para caber em uma faceta unicamente cosmética.

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Boas-vindas ao Bournout estético: aquele excesso de autocuidado que se torna exaustão disfarçada de disciplina. E aqui o foco acabou sendo a beleleza, mas podemos vê-lo se manifestando também em outras frentes.

Você já sentiu cansaço por ter que estar sempre bem — por dentro e por fora? Afinal, precisamos estar sempre bem-humorada, positiva, evoluída.

Tudo isso só me faz pensar em como a indústria da beleza e do bem-estar lucra com a insegurança e o cansaço das mulheres. Em como a apropriação de práticas ancestrais (como meditação, skincare natural, autocuidado feminino) foram convertidas em produtos caros e aspiracionais, que prometem muito e entregam pouco.

É um discurso da “cura” vendido em frascos e pacotes revestidos de promessas milagrosas.

Eu, que nunca fui uma pessoa positiva, me pego me forçando, dia após dia, a ser menos negativa, a fingir que não vi um potencial problema à frente, a tentar esconder meus anseios e inseguranças, porque há uma cobrança enorme para que eu tenha uma boa produtividade emocional.

Não trago essas reflexões para quem ama se cuidar e gosta de produtinhos, novamente: a ideia é evidenciar o motivo real por trás dessa virada em propagar uma pressão forte para um bem-estar performático e inalcançável.

Meu convite a você é: será que o seu autocuidado é mesmo seu? E se o que você precisa for, realmente, parar, respirar fundo e viver o seu melhor sem o peso de parecer sempre bem, disposta e bonita?

E se o que nós precisamos é desintoxicar a pele, o cabelo, o corpo, o coração e a alma de discursos vazios que tentam roubar a nossa paz?

Se for isso, já temos a resposta.

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